Nenhum protótipo desenvolvido na década de 50 na França teve tanto sucesso quanto aquele que viria a ser o Dassault Mirage III. Aquele período estava muito movimentado em relação a novos projetos aeronáuticos, novos caças sendo projetados e novas versões dos caças já existentes sendo lançadas. Os requerimentos da Armée de L´Air (Força Aérea Francesa) para um novo interceptador tinham entre outras especificações a de atingir 18.000 metros de altitude em até 6 minutos e ser um interceptador todo o tempo. A Dassault apresentou o Mystère-Delta MD-550 que tinha como rivais o Durandal SE.212 e o Trident SO.9000.
O projeto do MD 550 foi desenvolvido em Saint Cloud em 1953 com asa em delta e dois motores Armstrong Siddeley MD30R Viper fabricados sob licença. Em 22 de Março foi assinado um contrato para a concepção dos motores. Novos ajustes foram realizados no protótipo como aumento do assento do piloto, entradas de ar retraídas e bico do avião mais fino para acomodar melhor o radar, essas modificações contribuíram para a visibilidade do piloto.
Na manhã de 25 de Junho de 1955 decolando de Molun Villaroche com o piloto Roland Glavany no comando o MD 550-01 fez seu primeiro voo Com duração de 20 minutos o MD 550 atingiu os 3.000 pés, na mesma noite outro voo foi realizado, ambos sem a utilização de pós-combustão e foguetes extras de empuxo. Apesar dessa limitação em 24 de Julho o protótipo atingiu a velocidade de Mach 0,95 em um voo de mergulho.
Após um período de ajustes finos o avião atingiu a velocidade de Mach 1,3 em voo horizontal, mesmo assim não era o ideal para um novo interceptador pretendido pela força aérea francesa. Os testes continuaram e em Maio de 1956 novo voo com uma aeronave bem modificada, motor MD30R com pós-combustão com incremento de 1000Kg e equipado com foguetes SEPR 66 de 1.500Kg de 80s. Entradas de ar redesenhadas e outras mudanças fizeram a aeronave ter um peso vazio de 3.610Kg. Em 5 de Maio após novos ajustes o avião utilizou pela primeira vez o pós-queimador.
Cancelamento do Mirage e Mirage II e o surgimento do Mirage III
O MD 550-01 foi denominado Mirage e o MD 550-02 foi denominado Mirage II. O grande problema do Mirage foi a limitação no voo devido as entradas de ar não ajustáveis e motor com pouca potência, mesmo assim, seus voos continuaram até 1957 servindo de base ao desenvolvimento do Mirage IV e na melhoria dos estudos da asa em delta. Mais tarde foi armazenado em Bretigny, mas sua contribuição foi grande para as posteriores aeronaves mais avançadas e complexas capazes de atingir Mach 2.
O projeto MD 550-01 carregava pouca carga bélica devido ao seu tamanho e acabou dando lugar a um novo projeto com maior capacidade de carga, novo e único motor SNECMA ATAR 101G1 de 4.500Kg de empuxo e de maiores dimensões. Esse novo projeto foi batizado de Mirage III.
Em 17 de Novembro de 1956 com o piloto Roland Glavany no comando do Dassault Mirage III realizou seu primeiro voo. O que se viu na sequência foram cada vez mais voos que demonstravam as grandes qualidades da aeronave até ser a primeira aeronave a atingir a velocidade de Mach 2 na Europa. Em 11 de Junho de 1957 no seu 62° voo em uma apresentação no Paris Air Show o governo francês ficou muito impressionado com o desempenho do Dassault Mirage III o que levou a assinar um contrato para a produção em série do caça. Houve um pedido inicial de 10 Mirage IIIA de pré-série seguidos por um pedido maior de 100 aparelhos.
Sucesso comercial e no campo de batalha
Utilizando a base da mesma célula para fabricar várias versões a Dassault conseguiu fazer o custo da aeronave ficar mais acessível, o que foi um dos fatores do grande número de aparelhos vendidos ao redor do mundo. Outro detalhe é que os EUA se negavam a vender seu principal caça da época, o McDonnell Douglas F-4 Phantom II a determinados países e muitos deles passaram a comprar aviões da França.
Ao todo mais de 1.400 Mirage foram fabricados em diferentes versões, Mirage III B, C, D, E, R que foram utilizadas em 22 países participando de conflitos do Oriente Médio (guerra dos seis dias, You Kippur e outros), Africa e América do Sul. Além da França, Austrália, Bélgica e Suíça construíram versões do Mirage III sob licença. Israel construiu uma versão do Mirage 5 de forma ilegal a África do Sul também fabricou uma versão local que, apesar de não ser o Mirage é baseada no seu desenho, o Cheetah. O jato da Dassault foi um dos aviões de guerra mais importantes da história da aviação militar.
Porém, entre todas as versões a Mirage IIIE foi de fato a que tinha reais capacidades de multimissão. Com motor Atar 09-C de 13.900 libras de empuxo e radar Thomson-CSF Cyrano II com sistema de navegação Doppler foi exportado para muitas nações, entre elas nações sulamericanas.
O primeiro avião supersônico da Força Aérea Brasileira
O Brasil precisava de um substituto para os aviões Gloster Meteor adquiridos em 1954 e com vários problemas estruturais que foram surgindo ao passar dos anos, as tentativas de adquirir o F-4 Phantom II foram negadas pelo governo dos Estados Unidos e o Brasil buscou uma alternativa na Europa. Entre o Mirage IIE e o BAe Lightining inglês o Brasil ficou com o Dassault Mirage IIIE. O preço do jato francês foi um dos fatores que pesou na escolha, sendo que enquanto o Lightning custava US$ 2,3 milhões o Mirage saia por US$ 1.150 milhões.
A história do Mirage IIIEBR no Brasil teve início em Outubro de 1972 quando começaram a chegar os primeiros aviões que haviam sido encomendados em Maio de 1970. Ao todo o Brasil adquiriu 12 Mirage IIIEBR e 4 da versão IIIEDR, biposto de treinamento. Os aviões vinheram desmontados a bordo de cargueiros C-130 Hércules do 1°/1° Grupo de Transporte da Base Aérea do Galeão. Antes da chegada dos aviões em território nacional foi enviado a França um grupo de 8 pilotos para realizarem o treinamento e serem capacitados a operarem o Mirage III. Esse grupo embarcou para a França em 1971 com destino a Base de Aérienne de Dijon esses pilotos ficaram conhecidos como os Dijon Boys. Com a entrada em operação do Mirage IIIEBR a Força Aérea do Brasileira tinha um avião supersônico pela primeira vez, tornando-se um dos mais importantes aviões de guerra do Brasil.
Sediados em Brasilia pertenceram a 1° Alada (Ala de Defesa Aérea) que deu lugar a 1°GDA (Grupo de Defesa Aérea). Na FAB a nomenclatura do Dassault Mirage III é diferente sendo que o IIIEBR recebeu o nome de F-103E e o IIIDBR recebeu o nome de F-103D, além do apelido carinhoso de Jaguar. Para os bipostos seguiram a numeração a partir de 4901 e para os monoposto 4910. Os Mirage IIIEBR brasileiros tinham um motor SNECMA ATAR 09C7/038 que lhe conferiam um empuxo de 13.900 libras (6.305Kg) essa potência do motor dava uma velocidade máxima de Mach 2.2 ou 2.350Km/h.
O armamento constituía de mísseis Matra R530 carregados no pilone central, R550 guiador por infravermelho carregados aos pares nos pilones subalares, casulos de lança-foguetes não guiados e dois canhões DEFA 552 de 30mm. Na década de 90 o míssil israelense Python 3 passou a fazer parte do arsenal do Jaguar. O controle de fogo era gerenciado pelo radar Thompson-CSF Cyrano II e sistema de navegação Doppler.
A utilização do Dassault Mirage IIIEBR pela FAB foi extensa ao longo dos anos em muitos exercícios nacionais e com outras forças aéreas e também com interceptações reais como em 1982 quando interceptou um avião cubano que invadiu o espaço aéreo brasileiro. Outro acontecimento que teve participação do F-103E foi o sequestro do Boeing 737-300 do voo da Vasp VP-375 ocorrido em 29 de Setembro de 1988. Naquela ocasião o sequestrador tentou fazer o piloto jogar o avião contra o Palácio do Planalto e foi acompanhado pelos defensores da capital do Brasil. Outro fato que também marcou aconteceu em 29 de Abril de 1989 quando Ayrton Senna a bordo do F-103D da matrícula FAB4904 ultrapassou a barreira do som.
O fim do Dassault Mirage III na Força Aérea Brasileira e o Programa FX
Os Mirage IIIEBR da FAB ficaram em serviço por 32 anos e durante esse período passaram por duas modernizações de meia vida que incluíram a instalação de canards próximos às entradas de ar do motor e HOTAS, além de outras melhorias. No início da década de 90 os Jaguares passaram também a realizar missões de ataque ar-solo. Todavia, o radar não foi atualizado para padrões mais modernos e nem foi reailzada a instalação de um HUD que é vital nos combates aéreos dos dias atuais. Apesar da obsolência, que se agravou com o tempo, o Dassault Mirage IIIEBR foi um grande aparato dentro do poderio militar brasileiro.
O fim do Dassault Mirage IIIEBR na FAB aconteceu em 2005 e para o seu lugar foram adquiridos aviões provisórios até a decisão final da compra de novos aviões do programa FX-2. Para o lugar dos jaguares a FAB escolheu outro membro da família Mirage com asa em delta, o Mirage-2000.
Características técnicas do Dassault Mirage III
Tipo: caça monoposto de interceptação e ataque ao solo.
Envergadura: 8,22m
Comprimento: 15m
Altura: 4,50m
Superfície alar: 34,85m2
Peso vazio: 7.050Kg
Peso máximo de decolagem: 13.500Kg
Velocidade máxima: 2.350Km/h (Mach 2.2)
Teto de serviço: 17.000m
Autonomia: 1.200Km
Motor: Um turborreator SNECMA Atar 9c.c/ com pós-combustão com 13.600 libras de empuxo.
Armamento: Uma variedade de configurações confome a necessidade da missão podendo levar um míssil ar-ar Matra R530 no pilone central ou dois mísseis de curta alcance R550 nos pilones subalares, ou dois mísseis AIM-9 Sidewinder, ou dois mísseis Python 3 todos guiados por infravermelho. Além das opções de combate ar-ar há também as opções de ataque ar-solo com casulos da foguetes não guiados, bombas e mísseis guiados, além de dois canhões DEFA 552 de 30mm com 125 projéteis cada, totalizando até 4.000Kg de carga bélica.